21 de novembro de 2024

Mercado de surf aquece com Gabriel Medina

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Quando o Passat Surf foi lançado em 1978, houve quem sentisse falta de um bagageiro para transportar pranchas no teto.

Em 2004, a surfista peruana Sofía Mulánovich se consagrou com o título de campeã mundial e causou uma revolução no país. O mercado de surf no Peru se transformou e ainda colhe os frutos da vitória, 11 anos depois. Com apoio do poder público, de grandes patrocinadores e de entidades organizadas por atletas, o surf movimenta com força o turismo, o lazer, as escolas, a indústria e o comércio peruano.

O esporte é levado tão a sério que, em 2013, o governo aprovou uma lei histórica, para impedir a construção de novas edificações na faixa litorânea e proteger os picos de surf.

No Brasil, o título do primeiro campeão mundial do surf brasileiro, Gabriel Medina, desperta esperança entre surfistas e empresários, e surge uma questão: o que falta para o esporte estourar no País e movimentar com força a economia, como no Peru?

A conquista de Gabriel Medina pode servir de alavanca para que o esporte ganhe visibilidade e conquiste investimentos a longo prazo. As expectativas do presidente do Instituto Brasileiro do Surf (Ibrasurf), Alexandre Zeni, são altas. “Esperamos essa vitória há 50 anos. As fábricas de prancha receberam muitas encomendas neste verão, e as escolas de surf nunca tiveram tanta procura”, conta. No entanto, Zeni explica que um só Gabriel Medina não é suficiente. “É o trabalho de base que poderá render frutos no futuro”, esclarece.

Para o presidente da Academia Brasileira de Marketing Esportivo (Abraesporte), José Cocco, o efeito Medina pode ser comparado ao que aconteceu após a vitória do tenista Guga, em menores proporções. “Houve uma febre, o tênis se estruturou, mas não houve investimento suficiente para criar novos campeões”, resume. Cocco também ressalta que é difícil prever a durabilidade do efeito Medina no desenvolvimento do esporte, já que a e estrutura esportiva no País, em geral, não é profissionalizada para aproveitar os bons ventos.

Leis de incentivo ao esporte e editais lançados pelos governos municipais e estaduais podem ser instrumentos para a realização de eventos e projetos de gestão do surf, a partir das categorias de base. Cocco destaca, no entanto, que é preciso organização, liderada pelas entidades representativas do surf, junto aos órgãos públicos.O Ibrasurf estima que o surf movimenta R$ 7 bilhões no Brasil.

É difícil, no entanto, medir o tamanho do mercado, porque o esporte é, também, um estilo de vida, que fascina além dos 3 milhões de praticantes. Como destaca o presidente do Ibrasurf, Alexandre Zeni, a imagem do surf – jovem, saudável e libertária – dita tendências de consumo e faz com que o mercado cresça, em média, 10% ao ano. Patrocínio de surfistas e competições, ensino do surf, comércio de moda surf e fábricas de pranchas e acessórios são alguns dos segmentos que integram esse mercado.

De acordo com o Ibrasurf, 90% dos consumidores do mercado do surf no Brasil nunca pisaram em uma prancha. Somente o setor de confecções da moda surf movimenta R$ 2,5 bilhões, e representa 15% da indústria têxtil, segundo a Associação Brasileira da Indústria Têxtil (Abit). Não é raro, por exemplo, observar uma loja popular vender camisetas de algodão ou cadeiras de praia estampadas com ondas e pranchas.

Da mesma forma, cresce o número de empresas que não têm relação direta com o esporte, mas se aproveitam da imagem do surf para ampliar os negócios. É o caso, por exemplo, de metade dos patrocinadores de Gabriel Medina.

Das 10 marcas que apoiam o campeão mundial, cinco comercializam produtos que nada têm a ver com o esporte: refrigerante, serviços de telecomunicações, carros, smartphones e cosméticos. “O surf já foi considerado um esporte de preguiçosos, e hoje vende saúde, jovialidade e superação de desafios. Qualquer empresa que se comunica com jovens quer estar associada a esta imagem”, explica Zeni.

Nem todas as marcas que se aproveitam da imagem do surf em sua estratégia de marketing apostam, de fato, no esporte. Muitas surfam na onda do estilo de vida, mas não investem para que mais surfistas brasileiros possam se tornar campeões mundiais.

Segundo o presidente da Abraesporte, José Cocco, cabe aos esportistas, suas federações e associações trabalharem para buscar investimentos para o esporte, tanto da iniciativa privada quanto do poder público. As marcas que apoiam o futuro do esporte, em sua maioria, são lideradas por surfistas amadores ou ex-atletas, que já experimentaram caldos na água salgada.

No Rio Grande do Sul, uma das principais redes de moda surf, com 26 franquias, a Trópico é liderada pelo surfista e presidente da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre (CDL), Gustavo Schifino. A marca não tem fabricação própria, mas pretende expandir a atuação em todas as cidades com mais de 50 mil habitantes no Rio Grande do Sul e em Santa Catarina.

Schifino divide as concorrentes em marcas “legítimas” e “não legítimas”. “Marcas legítimas são aquelas que têm vínculo efetivo com o esporte. Essas são poucas“, indica. Ele estima que há 200 pontos no Estado que vendem produtos de marcas “legítimas” de surfware. Já em relação aos fabricantes de pranchas, chamados de “shapers”, calcula que existem, no máximo, dez no Rio Grande do Sul.

Entre os shapers, muitos ainda produzem de forma artesanal, mas há fábricas profissionalizadas, que utilizam tecnologia importada. Entre elas, a FR Surfboards, que comercializa pranchas e acessórios de fabricação própria.O empresário Fábio Ribeiro conta que o efeito Medina não é instantâneo nas vendas de prancha, já que o artigo tem um custo alto e exige que o praticante tenha condições de se deslocar até o litoral. “É diferente de uma raquete na era Guga. Para adquirir uma prancha, é preciso paixão.”

Na Escola de Surf Gaúcha, em Atlântida, o professor e surfista Carlos Alberto Dihl estima que o movimento de crianças cresceu 20% por causa do campeão mundial brasileiro. Mesmo assim, ele considera que o número de alunos por veraneio, cerca de 60, ainda é baixo.

Mesmo não tendo mar, ronda o mito de que Porto Alegre é a capital brasileira com maior número de surfistas, proporcional à quantidade de habitantes. Como destaca o vice-presidente da Federação Gaúcha de Surf (FGSurf), Evandro Dias Gomes, o surf movimenta o turismo no Litoral, mesmo sem o Estado contar com um calendário fixo de competições. “Os campeonatos são pelo amor ao esporte, porque não temos condições de promover eventos que permitam o sustento de surfistas profissionais“, aponta Gomes.

Quem é surfista no Rio Grande do Sul tem como ganha-pão outra atividade. O vice-presidente da FGSurf reclama das marcas que vendem surf, mas não investem no esporte. “Muito por culpa nossa, pois precisamos nos organizar, mas também muito por culpa dos empresários”, acredita.
No Rio Grande do Sul, algumas empresas já criaram projetos de piscinas com ondas – um deles no Clube Farrapos
-, mas nunca saíram do papel.

Fonte: Jornal do Comércio (Porto Alegre – RGS – 16/03/2015)

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